O Presidente Negro é um livro de ficção de Monteiro Lobato, de 1926, cuja trama se passa nos Estados Unidos, no ano 2028. Lobato cogitou tal possibilidade para os Estados Unidos em um futuro remoto, jamais para o Brasil. Já temos um possível nome, ainda que remoto. Com o julgamento do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa chama mais uma vez a atenção para sua figura impar. É “O Negão”, personalidade que, segundo o imaginário popular, veio debaixo, do povão, chegou lá pela competência e hoje enfrenta com imensa coragem as elites políticas corruptas.
Detalhe pouco lembrado: ele será presidente do Supremo (por antiguidade) em novembro de 2012, assim que terminar o julgamento do mensalão. Tem planos para enfrentar seus próprios pares a fim de mexer com as estruturas viciadas do Judiciário. Se der certo, pode vir a consolidar sua imagem popular. E depois disso? Qual o futuro que o Destino lhe reserva?
Toda história deve ter início, meio e fim. E, nesse caso, o preâmbulo nos remete ao remoto ano de 2006, quando Joaquim Barbosa pegou a missão de relatar o processo do mensalão. Naquela ocasião, Lula estava em frangalhos políticos, cogitava até mesmo não ser candidato à reeleição. Seu principal adversário era o Geraldo Alckmin, que jamais encantou. Vários partidos buscavam candidatos, como o PSol, que acabou disputando com Heloísa Helena, e o PSB, que lançou Ciro Gomes. Poucos acreditavam que Lula ressuscitaria das cinzas e ainda teria músculos para eleger uma técnica desconhecida e sem carisma como sucessora.
Sem ter nada a ver com a política, Joaquim acenou que seria duro com os réus do mensalão em seu futuro relatório. Fez simplesmente isso. Mas bastou um mero aceno para começar a construir uma imagem pública no imaginário popular, auxiliado por dezenas de reportagens que relatavam sua infância pobre em Paracatu, o filho de um mecânico de automóveis que passou no difícil vestibular em Direito da Universidade de Brasília, conquistou por concurso vaga de Procurador da República, depois PhD por Sorbonne, professor de Direito na Califórnia, jovem desembargador do Ministério Público Federal, até chegar ao Supremo.
Enfim, alguém que chegou lá por seus próprios méritos, e não somente por conta da política de cotas raciais iniciada no governo Lula.
Resultado: Joaquim começou a usufruir de inesperada popularidade. Era aplaudido de pé nos restaurantes que porventura entrasse –presenciei uma cena dessas em uma pizzaria no bairro da Asa Sul e li sobre muitas outras. Era cumprimentado por populares nos shoppings de Brasília e pelas ruas Rio de Janeiro, onde mantém apartamento no bairro do Flamengo, com belíssima vista para a Bahia da Guanabara, comprado em suaves prestações quando ainda era procurador de primeira instância.
Certo dia foi a São Paulo e teve que caminhar por alguns quarteirões. Foi-lhe muito difícil, tamanho o assédio de populares que queria abraçá-lo.
Ganhou então o apelido popular e carinhoso de “Negão do Supremo”, ou simplesmente “O Negão”. Ninguém se importava muito de lembrar de seu nome, nem de seu cargo exato. E ainda não se importa. Mas criou-se no imaginário social a ideia de que no Brasil existia um “Negão” que veio debaixo, gente como a gente, hoje juiz muito poderoso e corajoso, sem papas-na-língua, e que iria dar jeito na pouca-vergonha desses políticos.
Foi nesse cenário de época que Joaquim chegou a ser sondado por partidos políticos para uma eventual candidatura à Presidência da República. Foi até mesmo fortemente assediado pelo PMDB de Michel Temer. Declinou dos convites, como é sabido.
Mas ainda no calor daquelas circunstâncias, Joaquim Barbosa chegou a revelar parte de seus planos a um amigo de confiança. Primeiro teria que se dedicar muito ao processo do mensalão, que demandaria todo seu tempo pelos anos subsequentes. Teria que fazer um bom trabalho nesse processo. E vencer. Estamos nesse momento na linha do tempo.
Em 2012, explicou ele ao amigo lá naquele remoto 2006, chegaria sua hora de ser presidente do Supremo. Ao término do seu mandato, talvez não tivesse muito sentido para seu coração voltar a ser um ministro comum –ainda que ser um dos 11 ministros da Supremo Corte jamais venha algo banal. Mas apenas estudar processos e escrever votos talvez não lhe fosse mais estimulante. Ai, então, seria possível que viesse a cogitar novos desafios. O final de seu mandato na presidência do Supremo coincide com a próxima eleição presidencial.
Obviamente precisará fazer mandato diferenciado na Presidência do Supremo para efetivar aquilo que o imaginário popular espera dele. Tudo indica que Joaquim terá um futuro repleto de adversidades, mas também com uma visibilidade que nenhum de seus antecessores usufruiu.
Ele já confidenciou a amigos que pretende mexer com algumas estruturas viciadas do judiciário. Um dos esquemas (expressão deste escriba, ressalte-se) que muito o incomoda é a prática de dezenas de advogados, filhos de magistrados de tribunais superiores, pegarem causas justamente nas cortes onde seus papais são ministros. Ou o revezamento que poucos advogados especializados em Direito Eleitoral, amigos de convescote de ministros do Supremo, serem indicados para ministros (temporários) do Tribunal Superior Eleitoral, o TSE.
Joaquim tem algumas características da personalidade (forte) que lhe ajudam, outras que atrapalham. Seus amigos convergem na assertiva sobre sua integridade moral rara. Chega a ser um jacobino. É um estoico, com hábitos pessoais ascéticos, próximos aos de um eremita. Os amigos também convergem sobre sua imensa coragem pessoal e disposição de enfrentar poderosos.
Mas falta a Joaquim a capacidade de boa convivência entre seus pares (e decerto entre políticos), aquilo que hoje se chama de inteligência emocional. Ele entrou no julgamento do mensalão está rompido (ou com rusgas) com mais da metade de seus pares de Corte. Em poucos dias, conseguiu criar arestas com quase todos. Imaginem o que poderá ocorrer quando vier a mexer com as tais estruturas viciadas do judiciário? Decerto sofrerá boicotes de muitos e apoio de poucos. Ademais, por conta de sua personalidade por demais independente, será difícil que algum grande partido político lhe confie a legenda. Mas decerto sobrarão legendas para circundá-lo.
O assédio político que o “Negão do Supremo” sofreu há seis anos pode não significar coisa alguma de relevante na eleição presidencial de 2014, quando desde já Dilma Roussef desponta como franca favorita. Entretanto, invocando a célebre frase de Magalhães Pinto –política é como nuvens, a cada momento em que olhamos para o céu elas estão diferentes.
Assim, neste momento em que os olhos do eleitorado se voltam para o processo do mensalão, no qual Joaquim é sem dúvida a grande estrela, torna-se prudente aos que gostam de prospecções incluí-lo entre os vetores que despontam horizonte.
Toda história deve ter início, meio e fim. E, nesse caso, o preâmbulo nos remete ao remoto ano de 2006, quando Joaquim Barbosa pegou a missão de relatar o processo do mensalão. Naquela ocasião, Lula estava em frangalhos políticos, cogitava até mesmo não ser candidato à reeleição. Seu principal adversário era o Geraldo Alckmin, que jamais encantou. Vários partidos buscavam candidatos, como o PSol, que acabou disputando com Heloísa Helena, e o PSB, que lançou Ciro Gomes. Poucos acreditavam que Lula ressuscitaria das cinzas e ainda teria músculos para eleger uma técnica desconhecida e sem carisma como sucessora.
Sem ter nada a ver com a política, Joaquim acenou que seria duro com os réus do mensalão em seu futuro relatório. Fez simplesmente isso. Mas bastou um mero aceno para começar a construir uma imagem pública no imaginário popular, auxiliado por dezenas de reportagens que relatavam sua infância pobre em Paracatu, o filho de um mecânico de automóveis que passou no difícil vestibular em Direito da Universidade de Brasília, conquistou por concurso vaga de Procurador da República, depois PhD por Sorbonne, professor de Direito na Califórnia, jovem desembargador do Ministério Público Federal, até chegar ao Supremo.
Enfim, alguém que chegou lá por seus próprios méritos, e não somente por conta da política de cotas raciais iniciada no governo Lula.
Resultado: Joaquim começou a usufruir de inesperada popularidade. Era aplaudido de pé nos restaurantes que porventura entrasse –presenciei uma cena dessas em uma pizzaria no bairro da Asa Sul e li sobre muitas outras. Era cumprimentado por populares nos shoppings de Brasília e pelas ruas Rio de Janeiro, onde mantém apartamento no bairro do Flamengo, com belíssima vista para a Bahia da Guanabara, comprado em suaves prestações quando ainda era procurador de primeira instância.
Certo dia foi a São Paulo e teve que caminhar por alguns quarteirões. Foi-lhe muito difícil, tamanho o assédio de populares que queria abraçá-lo.
Ganhou então o apelido popular e carinhoso de “Negão do Supremo”, ou simplesmente “O Negão”. Ninguém se importava muito de lembrar de seu nome, nem de seu cargo exato. E ainda não se importa. Mas criou-se no imaginário social a ideia de que no Brasil existia um “Negão” que veio debaixo, gente como a gente, hoje juiz muito poderoso e corajoso, sem papas-na-língua, e que iria dar jeito na pouca-vergonha desses políticos.
Foi nesse cenário de época que Joaquim chegou a ser sondado por partidos políticos para uma eventual candidatura à Presidência da República. Foi até mesmo fortemente assediado pelo PMDB de Michel Temer. Declinou dos convites, como é sabido.
Mas ainda no calor daquelas circunstâncias, Joaquim Barbosa chegou a revelar parte de seus planos a um amigo de confiança. Primeiro teria que se dedicar muito ao processo do mensalão, que demandaria todo seu tempo pelos anos subsequentes. Teria que fazer um bom trabalho nesse processo. E vencer. Estamos nesse momento na linha do tempo.
Em 2012, explicou ele ao amigo lá naquele remoto 2006, chegaria sua hora de ser presidente do Supremo. Ao término do seu mandato, talvez não tivesse muito sentido para seu coração voltar a ser um ministro comum –ainda que ser um dos 11 ministros da Supremo Corte jamais venha algo banal. Mas apenas estudar processos e escrever votos talvez não lhe fosse mais estimulante. Ai, então, seria possível que viesse a cogitar novos desafios. O final de seu mandato na presidência do Supremo coincide com a próxima eleição presidencial.
Obviamente precisará fazer mandato diferenciado na Presidência do Supremo para efetivar aquilo que o imaginário popular espera dele. Tudo indica que Joaquim terá um futuro repleto de adversidades, mas também com uma visibilidade que nenhum de seus antecessores usufruiu.
Ele já confidenciou a amigos que pretende mexer com algumas estruturas viciadas do judiciário. Um dos esquemas (expressão deste escriba, ressalte-se) que muito o incomoda é a prática de dezenas de advogados, filhos de magistrados de tribunais superiores, pegarem causas justamente nas cortes onde seus papais são ministros. Ou o revezamento que poucos advogados especializados em Direito Eleitoral, amigos de convescote de ministros do Supremo, serem indicados para ministros (temporários) do Tribunal Superior Eleitoral, o TSE.
Joaquim tem algumas características da personalidade (forte) que lhe ajudam, outras que atrapalham. Seus amigos convergem na assertiva sobre sua integridade moral rara. Chega a ser um jacobino. É um estoico, com hábitos pessoais ascéticos, próximos aos de um eremita. Os amigos também convergem sobre sua imensa coragem pessoal e disposição de enfrentar poderosos.
Mas falta a Joaquim a capacidade de boa convivência entre seus pares (e decerto entre políticos), aquilo que hoje se chama de inteligência emocional. Ele entrou no julgamento do mensalão está rompido (ou com rusgas) com mais da metade de seus pares de Corte. Em poucos dias, conseguiu criar arestas com quase todos. Imaginem o que poderá ocorrer quando vier a mexer com as tais estruturas viciadas do judiciário? Decerto sofrerá boicotes de muitos e apoio de poucos. Ademais, por conta de sua personalidade por demais independente, será difícil que algum grande partido político lhe confie a legenda. Mas decerto sobrarão legendas para circundá-lo.
O assédio político que o “Negão do Supremo” sofreu há seis anos pode não significar coisa alguma de relevante na eleição presidencial de 2014, quando desde já Dilma Roussef desponta como franca favorita. Entretanto, invocando a célebre frase de Magalhães Pinto –política é como nuvens, a cada momento em que olhamos para o céu elas estão diferentes.
Assim, neste momento em que os olhos do eleitorado se voltam para o processo do mensalão, no qual Joaquim é sem dúvida a grande estrela, torna-se prudente aos que gostam de prospecções incluí-lo entre os vetores que despontam horizonte.
Texto: Hugo Studart
Fonte: afropress.com