terça-feira, 6 de maio de 2008

XII MARCHA NOTURNA

A
Marcha Noturna
Nos últimos doze anos, sempre no dia 12 de maio, a comunidade negra se reúne para celebrar seu histórico de resistência, percorrendo ruas do centro da cidade que marcaram a trajetória da população negra na luta pela conquista do direito à liberdade. Através da memória de importantes personalidades negras, destacando-se aqui o Padre Batista e de espaços que se confundem com a história dos negros na capital paulista, a Marcha pretende consagrar a resistência histórica da comunidade negra e erguer as bandeiras da luta negra contemporânea.
A Marcha Noturna inicia o primeiro minuto do dia 13 de maio como um protesto contra o racismo e todas as formas de discriminação.
O percurso da Marcha tem sido o mesmo nestes últimos doze anos, privilegiando a passagem por importantes pontos históricos.
A Igreja Nossa Senhora da Boa Morte, ponto de partida da Marcha, fica na Rua do Carmo, esquina com a Rua Tabatinguera “nome indígena de origem Caiubi”, é historicamente conhecida por ser o local onde escravos “rebeldes” e condenados recebiam as últimas “bênçãos” antes de serem executados.
A Igreja Nossa Senhora da Boa Morte, é o local que o Padre Batista foi capelão e iniciou o seu trabalho com crianças e adolescentes de rua, sendo a mesma tombada pelo Patrimônio Histórico do Estado de São Paulo.
Depois, a Marcha prossegue pela Praça Clóvis Bevilácqua, Praça da Sé (onde havia um Pelourinho no século XVII). Também é local que o Padre Batista trabalhou como padre na Catedral da Sé e desenvolveu um grande trabalho com crianças e adolescentes de rua e muitas vezes protegendo-os da violência policial, seguindo pela Rua Roberto Simonsen, Rua Venceslau Brás (sede do Instituto do Negro Padre Batista), Rua Quinze de Novembro (que antigamente tinha o nome de Rua do Rosário dos Homens Pretos).
Em seguida a Marcha chega a Praça Antonio Prado, antigo Largo do Rosário, onde em 1724, foi construída a Igreja de Nossa senhora do Rosário dos Homens Pretos, que possuía um cemitério para o enterro de pessoas negras, permanecendo neste local até o final do século XIX.
O trajeto segue pela Avenida São João, Rua Líbero Badaró, Viaduto do Chá e Praça Ramos de Azevedo, local que fica o Teatro Municipal e em 1978, foi lançado em suas escadarias o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial.
O caminho continua pela Rua Conselheiro Crispiniano, chegando, enfim, ao Largo do Paissandu, onde atualmente está localizada a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos (que foi transferida no início do século XX da Praça Antonio Prado e inaugurada em 1904), local que termina a Marcha em homenagem à luta e a resistência desta igreja, desde o período da escravidão até os dias de hoje.

HISTÓRICO
Nestes 12 anos, a Marcha noturna reuniu milhares de pessoas e levou às ruas diversas reivindicações, segue um breve resumo de cada uma das marchas:
A I Marcha Noturna ocorreu em 1997 e teve como tema: NEGROS NAS RUAS NA MADRUGADA DO 13 DE MAIO, sendo promovida e idealizada pela Subcomissão do Negro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil - Secção São Paulo e teve a adesão de várias entidades do movimento negro. Nesta primeira edição foi Fixado o simbolismo, o objetivo de denúncia do racismo existente no país e a necessidade de implantação de políticas públicas, bem como o resgate dos heróis anônimos afro-brasileiros. Foi escolhido, como ponto final da marcha a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, em face da luta desta irmandade e resistência do povo negro com o nosso passado de luta por Zumbi e pelo Batalhão do Paissandu.
A partir de 1998, a Marcha Noturna pela Democracia Racial passou a ser organizada pelo Instituto do Negro Padre Batista. A II Marcha enfocou A LUTA CONTRA O DESEMPREGO, A MISÉRIA E A FOME dos afrodescendentes, que, conforme dados estatísticos, são as maiores vítimas da política de exclusão vivenciado pelo Brasil. Neste ano, houve uma ampliação das entidades participantes, integrando-se sindicatos patronais e de empregados, empresários, artistas, parlamentares, associações e vários outros seguimentos da sociedade civil.
A III Marcha refletiu a permanência da crise sócio-econômica brasileira, daí o tema: DESEMPREGO E RESISTÊNCIA – 500 ANOS DE EXCLUSÃO DO NEGRO NO BRASIL. Neste ano de 1999, o percurso inicial foi alterado em razão da decisão de resgatar os espaços históricos e sagrados para a formação do povo paulistano, assim, a saída foi da Igreja da Boa Morte, que guarda o lamento dos escravos condenados, que antes de sua execução, passavam por ela a fim de expressar a Nossa Senhora um último desejo: uma boa morte.
A IV Marcha teve como tema: NOSSOS 500 ANOS DE RESISTÊNCIA NEGRA, mostrando nossa capacidade de resistir e lutar contra a opressão ao longo dos 500 anos, quando então, inserimos, na liturgia da Marcha Noturna “banner’s” homenageando nossos heróis e heroínas negros.
A V Marcha, realizada em 2001, teve como tema: NEGRITUDE A CAMINHO NO TERCEIRO MILÊNIO EM BUSCA DE EDUCAÇÃO , MORADIA, SAÚDE, TRABALHO E TERRA, revelando o resgate do ideal da utopia quilombola, que nos permitiu resistir à escravidão e demonstrar ao longo de 500 anos a nossa capacidade permanente de sobreviver ao racismo, à opressão e às desigualdades econômicas e sociais na busca de uma sociedade fraterna multicultural e com igualdades de oportunidades para todos os cidadãos.
A VI Marcha, realizada em 2002, teve como tema: POLÍTICAS AFIRMATIVAS JÁ! Ressaltando a importância das políticas afirmativas já delineadas desde meados dos anos 60 por Martin Luther King, o qual defendia a criação de leis anti-racistas nos EUA, no sentido de que o negro fosse respeitado. A adoção imediata de medidas afirmativas efetivas garantiria que as versões futuras da Marcha conduzidas por nossos filhos e netos encontrem uma sociedade mais justa e igualitária como palco de homenagens aos nossos antepassados.
A VII Marcha, realizada em 2003, teve como tema: NEGROS, BRANCOS, INDÍGENAS, ORIENTAIS UNIDOS PELA PAZ, depois de muita luta, pudemos visualizar algumas conquistas significativas. Neste ano foram empossados quatro ministros de estado negros. Também foi criada a Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, e ainda, empossado o primeiro negro a ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal. Neste mesmo ano, uma coalizão anglo-americana resolveu, de forma absolutamente unilateral e contra a orientação da ONU, invadir o Iraque, ocasionando o massacre de civis inocentes que poderia ser evitado através do diálogo. Desta forma o tema desta Marcha baseou-se na defesa da paz e da justiça entre os povos.
A VIII Marcha, realizada em 2004, teve como tema: CIDADANIA QUILOMBOLA. Os quilombos surgiram a partir da reunião de homens e mulheres que não se conformavam com a escravização de negros e índios impostas pelos europeus nas Américas. Rememorando esta luta, foi escolhido este tema, com a finalidade de homenagear os homens e mulheres quilombolas que, já no início da formação da sociedade brasileira, lutavam pela reconquista de sua liberdade e apesar de ter seus direitos garantidos na Constituição Federal, ainda hoje lutam pela titulação de suas terras.
A IX Marcha, realizada em 2005, teve como tema: BASTA DE VIOLÊNCIA QUEREMOS A PAZ! O tema foi escolhido devido à tamanha violência, somada a outros instrumentos do racismo estrutural, que afeta sobremaneira a construção identitária dos negros e negras deste país. Ao marcharmos contra a violência, pelo fim do racismo, pela igualdade e pela paz, reivindicamos dos governos o combate à pobreza, investimentos efetivos na educação, promoção de lazer às crianças e jovens, acesso democrático às novas tecnologias e democratização dos meios de comunicação.
A X Marcha, realizada em 2006, teve como tema: COTAS, AFIRMANDO DIREITOS E CONSTRUINDO POLÍTICAS PÚBLICAS. Diante da ampla discussão a respeito das políticas de ações afirmativas, que reconhecem a necessidade de inclusão no ensino superior e no mercado de trabalho, as populações historicamente excluídas – indígenas, negros, mulheres, homossexuais e portadores de deficiência - tornaram-se sujeito de um debate nacional, focado principalmente na implementação de COTAS para negros e estudantes de escolas públicas nas universidades federais e estaduais.
A XI Marcha, realizada em 2007, teve como tema: O GENOCÍDIO DA JUVENTUDE NEGRA. Diante de um grande numero de mortes de jovens negros e de números estatísticos gritantes, a comissão organizadora da Marcha, escolheu este tema para chamar a atenção da sociedade brasileira e ao mesmo tempo cobrar das autoridades medidas concretas para acabar com este genocídio. Os dados do Mapa da Violência de 2006 situam o Brasil em 3º lugar no assassinato de jovens, num ranking de 84 países. Dentre os jovens assassinados, jovens negros tem o maior índice de vitimação, 85,3%, superior aos jovens brancos. Além disso, o estudo apontou que o que o crescimento do número de homicídios nas últimas décadas no Brasil, explica-se exclusivamente pelo aumento de homicídios contra a juventude.

XII Marcha Noturna
Na XII edição da Marcha Noturna o tema será: 120 ANOS DE FALSA ABOLIÇÃO DA ESCRAVATURA - PELA APROVAÇÃO DO ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL. Assinada em 13 de maio de 1888 com o intuito de extinguir a escravidão no Brasil, neste ano de 2008, a Lei Áurea completa 120 anos. Sua assinatura foi decorrência de pressões internas e externas: o movimento abolicionista já tinha grande força no país, haviam frequentes fugas de negros, o exército já se recusava a fazer o papel de capitão-do-mato. Além disso, estava se tornando economicamente inviável manter o trabalho escravo, em face da concorrência com a mão-de-obra imigrante, barata e abundante. O Brasil foi o último país independente do Ocidente a erradicar a escravatura. A Constituição do Império, outorgada em 1824, embora mais liberal do que várias outras Cartas monárquicas, mantinha a escravidão usando de um subterfúgio hipócrita: declarava o respeito aos direitos de propriedade, ao mesmo tempo que empregava, em certas passagens, a expressão "homens livres", o que dava a entender que nem todos eram livres, e que era legítima a propriedade sobre os não-livres.
De fato, com a abolição, mantinha-se não só a desigualdade econômica e social entre brancos e negros, mas principalmente a ideologia que definia bem a diferença entre os dois e reservava ao negro uma posição de submissão. O processo de passagem da condição de escravo para a de cidadão foi feito de maneira errada e sem se pensar o que fazer com o contingente de trabalhadores livres. De um dia para o outro, negros e negras foram declarados livres e após a abolição encontravam- se sem abrigo, trabalho e meios de subsistência. Mesmo sendo forçado, no trabalho havia a possibilidade de subsistência. Com a libertação, não se considerou a necessidade de proporcionar- lhes meio de sobrevivência, como posse da terra para sua fixação. Sem direito a terra, estava decretado o primeiro passo para sua marginalização e desfavorecimento. Após a abolição, a população negra parte das senzalas para as margens sociais e econômicas da sociedade. Permanecendo nas fazendas, ou migrando para os centros urbanos, a possibilidade de renda para os negros e negras verificou-se quase nula, sendo os salários quase sempre aviltados devido a grande oferta da força de trabalho.
Nesse contexto, se dá o processo de favelamento urbano e a disseminação de doenças, devido às péssimas condições de vida. Também cresce neste período a repressão policial contra a população negra.
Com o predominância do capitalismo, a população negra, vitima das consequências sociais do racismo, fica à margem do processo ou é utilizado em serviços pesados. Essa situação se reflete, para a população negra, não apenas economicamente, mas leva a um processo de marginalização social, já que preconceito e discriminação ganham, então, novos significados e espaços de atuação, voltados para a defesa desta estrutura de privilégios.
Na sociedade contemporânea, mesmo disfarçado, o racismo ainda é a forma mais explicita de discriminação na sociedade brasileira. Isso se verifica facilmente ao analisarmos dados das áreas da saúde e da educação, nos indicadores econômicos e no acesso ao saneamento básico.
Diante desta realidade, a coordenação da XII Marcha Noturna, em consonância com o movimento negro e a população negra brasileira, defende a implementação de políticas publicas que atinjam de forma frontal este problema, bem como uma legislação que combata a desigualdade e garanta o acesso à cidadania. Com efeito, elegemos conjuntamente com o tema dos 120 anos de abolição a bandeira PELA APROVAÇÃO DO ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL.
O Estatuto da Igualdade Racial trata-se de um conjunto de leis que visa garantir os direitos fundamentais da população negra brasileira. Dispõe sobre um conjunto de políticas públicas de superação da desigualdade racial, entre eles:
- acesso universal e igualitário ao Sistema Único de Saúde (SUS) para promoção, proteção e recuperação da saúde dessa parcela da população;
- respeito às atividades educacionais, culturais, esportivas e de lazer, adequadas aos interesses e condições dos negros brasileiros;
- garantia dos direitos fundamentais das mulheres negras;
- reconhecimento do direito à liberdade de consciência e de crença e da dignidade dos cultos e religiões de matriz africana praticadas no Brasil;
- instituição de políticas de inclusão social, buscando corrigir as desigualdades raciais que marcam a realidade brasileira;
- direito à propriedade definitiva das terras aos remanescentes de quilombos;
- veiculação, pelos meios de comunicação da herança cultural e a participação dos negros brasileiros na história do país;
- criação de ouvidorias, garantindo às vítimas de discriminação racial o direto de serem assistidas;
- implementação de políticas voltadas para a inclusão de negros no mercado de trabalho;
- criação de um fundo nacional de promoção da igualdade racial, que tem por objetivo garantir a implementação das presentes no estatuto.

Desta forma, o Estatuto da Igualdade Racial tem por objetivo primeiro, ocupar um espaço vazio no tocante a legislação voltada aos negros brasileiros, garantindo a existência de um mecanismo legal que dê conta das demandas apresentadas por esta população. De fato, fortalece o debate da igualdade, contribuindo para a inclusão de grupos discriminados, a partir de uma perspectiva de igualdade.

OBJETIVO
A XII Marcha Noturna e semana Padre Batista de combate à discriminação racial tem como objetivos:
- Resgatar a memória de importantes personalidades negras e de espaços que se confundem com a história dos negros na capital paulista;
- Consagrar a resistência histórica da comunidade negra e erguer as bandeiras da luta negra contemporânea;
- Denunciar o racismo presente na sociedade brasileira e chamar a atenção da população para as ações voltadas a promoção da igualdade racial de oportunidades;
- Discutir com organizações dos movimentos sociais negros, de mulheres negras e demais movimentos, entidades e pessoas a construção de ações que visem a igualdade racial de oportunidades;
- Promover um momento de reflexão em relação ao combate a intolerância;
- Trabalhar as principais bandeiras de luta do movimento negro.
- Consolidar a Marcha Noturna como momento de celebração e luta da população negra.

PROGRAMAÇÃO E CRONOGRAMA
Dia 12 de maio de 2008
17h – Inicio das atividades.
18h – Ato cultural, em frente à igreja Nossa Senhora da Boa Morte.
20h30 – Entrega do prêmio Padre Batista de combate à discriminação.
21h – Ato inter-religioso.
22h – Inicio da Marcha Noturna.
23h345– Chegada ao Largo do Paissandu e Ato final.
00h – Abraço coletivo na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos.
00h10 – Término da Marcha.

ROTEIRO DA MARCHA
- Rua do Carmo / Igreja Nossa Senhora da Boa Morte.
- Praça Clóvis Bevilácqua.
- Praça da Sé.
- Rua Roberto Simonsen.
- Rua Venceslau Brás.
- Rua Quinze de Novembro.
- Praça Antonio Prado.
- Avenida São João.
- Rua Líbero Badaró.

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